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Rede da Legalidade em Ondas Curtas

Leonel de Moura Brizola - 22/01/1922 - 21/06/2004

Homenagem ao estadista, lutador incansável da causa e interesse do povo brasileiro.

 

"Brizola, sua imagem permanece"

 

Ignorado pela grande imprensa, o dia 26 de agosto , data da Legalidade, faz parte do calendário de lutas do povo brasileiro pelo respeito aos seus direitos políticos. Nenhum especial no rádio e na televisão, nenhum suplemento de jornal costuma ser publicado nesse dia. A ordem é passar a esponja no episódio, para que ele não lembre a figura heróica de Brizola. Mas seu lugar está garantido na História, que é inapagável.


O Movimento pela Legalidade

Insistindo na necessidade de cumprir-se a constituição a qualquer preço, o governador do Rio Grande do Sul, Leonel Brizola, cunhado de João Goulart, mobilizou-se. Imediatamente formou a “Cadeia da Legalidade”, uma rede das rádios gaúchas que, desde o porão do Palácio Piratini, conclamava o povo a ir para as ruas a fim de dar o seu apoio à normalidade constitucional e contra o golpe da junta militar de Brasília.

No dia 27 de agosto de 1961, Brizola requisitou os transmissores da rádio Guaíba de Porto Alegre, e através das ondas médias e curtas do rádio fazia pronunciamentos a todo país, conclamando o povo a defender a legalidade. Em seguida, as demais emissoras de Porto Alegre e as emissores do interior do Estado, uniram-se à Guaíba, formando a grande Rede da Legalidade.

A Rede Radiofônica da Legalidade funcionava 24 horas por dia, nos porões do Palácio Piratini, Sede do Governo Estadual e onde estava montada a Cidadela da Legalidade. Contava com a participação de jornalistas, radialistas e técnicos de todas as emissoras. O alcance foi tanto que em determinados momentos ela tinha 100% de audiência no estado.


Leonel Brizola em 1961

Com o aumento da abrangência, chegou a ter 104 emissoras em cadeia no Brasil e nos países vizinhos, foram transmitidos boletins noticiosos em diversos idiomas, como inglês, espanhol e alemão.

Este foi sem dúvida um dos momentos mais históricos e importantes do rádio brasileiro. Em nenhuma outra ocasião se usou este meio de comunicação de maneira tão singular e primordial a ponto de influenciar os destinos de toda uma nação.

O ex-governador do estado, Leonel Brizola, foi o homem que iniciou esta série de acontecimentos e durante todos os momentos esteve no centro deles. Não é por acaso que a sua voz era sem dúvida a mais esperada e a mais ouvida na chamada Rede da Legalidade.

As tropas da Brigada Militar foram então colocadas em estado de alerta para defender o Palácio e armou-se o clima de guerra civil. A capital do Estado, tornou-se, durante os doze dias que durou a crise, uma praça-de-guerra. O Brasil dividiu-se. De um lado estavam os legalistas, mobilizados por Leonel Brizola e apoiados por parte considerável da sociedade civil que mantinha-se fiel à constituição; do outro, alinhavam-se os golpistas da junta de Brasília, cuja sustentação civil mais significativa vinha do tonitruante Carlos Lacerda, o mais expressivo líder da UDN e velho inimigo dos getulistas.

O general Machado Lopes, comandante do III Exército, com controle sobre os Estados do Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná, em nome da legalidade e para não precisar reprimir as massas que apoiavam o governador gaúcho nas ruas de Porto Alegre, terminou por aderir ao movimento. Gesto que provocou “um racha” nas forças armadas brasileiras.

A solução parlamentarista

Entrementes, políticos e militares do centro do país negociavam uma solução constitucional que evitasse uma guerra civil e superasse a crise. Destacava-se, entre eles, Tancredo Neves, hábil parlamentar mineiro que tinha livre trânsito entre as partes conflitantes (Tancredo Neves era um político conservador, mas fora ministro da justiça de Getúlio Vargas, em 1954). Com esse fim, aprovou-se a chamada solução parlamentarista.

Por meio da emenda constitucional nº 4, aprovada às pressas em 2 de setembro de 1961, alterava-se o regime republicano brasileiro, substituindo o presidencialismo pelo parlamentarismo. João Goulart foi informado que poderia ser empossado desde que aceitasse dividir o poder executivo com um primeiro-ministro indicado pelo Congresso.

O vice-Presidente, que estava retornando ao Brasil via Uruguai, concordou com a proposta em nome da paz política e para evitar derramamento de sangue. Voou então de Porto Alegre para Brasília para assumir um cargo com poderes podados. Numa emocionante cerimônia realizada no Congresso Nacional no dia 7 de setembro de 1961, ele finalmente conseguiu receber a faixa presidencial que Jânio Quadros não soubera honrar.

Os doze dias tensos que o país havia passado deram lugar a uma enorme sensação de alívio. A solução parlamentarista parecia ter pacificado os sentimentos agressivos que ambas as partes, esquerda e direita, demonstraram no decorrer do episódio. Ao tempo em que dava posse a Goulart, não humilhava os chefes militares envolvidos no movimento do seu impedimento. 

As esquerdas e o plebiscito (1963)

As forças nacionalistas e esquerdista que se mobilizaram no apoio a ele, e de certo modo conseguiram impedir o golpe da junta militar, não se conformaram com as limitações impostas a Goulart pela emenda parlamentarista. Pressionaram o Presidente no sentido de realizar um plebiscito que restabelecesse a plenitude do presidencialismo no país, entendendo que era o momento dele retomar a ofensiva e recuperar, com o apoio do Congresso, as prerrogativas que os chefes militares tinham-lhe negado.

João Goulart sustentava-se ideologicamente nos nacionalistas, nos populistas e nos comunistas. Estas forças acreditavam que ele poderia vir a ser o grande reformador social que o país ansiava: o estadista capaz de realizar uma política de estatização dos setores estratégicos da economia, de dar espaço aos sindicatos, representados pela CGT (Central Geral dos Trabalhadores), e de fazer a tão ansiada reforma agrária nas terras dos latifundiários. Este programa amplo denominou-se Reforma de Base, e estava marcado pelo enfrentamento com os interesses dos proprietários em geral, apoiados pela grande imprensa conservadora.

Esse Programa também não contava com a simpatia ou o entusiasmo da classe média urbana que estava mais preocupada com a inflação e a crescente desordem social que grassava pelo país, manifestada pela onda ininterrupta de greves (se no governo de Jucelino houvera 177 em quatro anos, no período de Goulart, entre 1961-64, elas saltaram para 435). As preferências dos pequenos burgueses se inclinavam para os americanos e não para os cubanos. Mas para as esquerdas em geral, o governo Goulart representava uma situação cujo desenlace só poderia ser revolucionário.

O Presidente tinha ao seu lado os estudantes, representados pela UNE (União Nacional dos Estudantes), controlada pelos esquerdistas, os movimentos rurais como as Ligas Camponesas do Nordeste, lideradas pelo deputado Francisco Julião, do movimento Sem-Terra, do apoio dos escalões inferiores das Forças Armadas (suboficiais, sargentos, cabos e marinheiros) e da maioria dos sindicatos operários do país, ligados à CGT (Central Geral dos Trabalhadores). Tal ambicioso programa de reforma social e estrutural dificilmente poderia ser implementado se o presidente da república não tivesse seus poderes restaurados.

Ele tinha que deixar de parecer-se com a Rainha da Inglaterra, como então se dizia, “aquela que reina mas não governa”. Por fim, realizou-se o plebiscito. Em 6 de janeiro de 1963, o povo brasileiro manifestou-se por um sonoro “sim” a Goulart, apoiando a volta do presidencialismo. Sagrado pelas urnas, quando mais de 80% atendeu a sua demanda (10 milhões a favor do presidencialismo contra 2 milhões que foram pela continuidade do parlamentarismo), o Presidente recuperou a plenitude do seu mandato, emasculado pelo acordo de setembro de 1961.

Os preparativos do Golpe Militar de 1964

A Direita brasileira (conservadores, liberais udenistas, ativistas anticomunistas e neofascistas) vinha há muitos anos articulando um golpe militar que pusesse um fim definitivo na república populista. No seu acervo conspirativo e golpista, constava a tentativa de impugnação da eleição de Getúlio Vargas, em 1951; a pressão pela deposição de Getúlio Vargas em 1954 (golpe que foi sustado pelo impacto que seu suicídio causou na opinião publica); a tentativa de impedir a posse de Jucelino Kubitschek, em 1955; os levantes de oficiais da FAB em Jacarecanga, em 1956, e em Aragarças, em 1959; e, por último, no veto a que João Goulart assumisse a presidência em 1961.

Aproveitando-se da trégua provocada pela adoção do sistema parlamentarista, formou-se um imenso arquipélago de conspirações pelo Brasil. Setores anti-janguistas, formando ilhas de conluios nem sempre secretos, reuniram-se tanto nas agremiações militares como dentro dos quartéis, em partidos políticos e nas associações empresariais.

Como principais articuladores do golpe de 1964, além das lideranças civis formadas pelos grandes proprietários e pelos governadores de Minas Gerias (Magalhães Pinto), da Guanabara (Carlos Lacerda ) e de São Paulo (Ademar de Barros), achavam-se os marechais Odílio Denys e Eurico Gaspar Dutra, e, mais discretamente, o general Humberto Castello Branco, chefe do Estado Maior do Exército, que agia com a máxima prudência

Expressando o sentimento da classe média afluente, que ascendera desde o jucelinismo, havia a crença de que o país deveria ser dirigido por uma neo-oligarquia empresarial-militar que superasse o populismo e que seu poder, de certo modo, fosse imune às influências eleitorais. A função aglutinadora desta elite antipopulista foi executada pelo IPES/IBADE (Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais/Instituto Brasileiro de Ação Democrática), instituições essas que mobilizavam empresários e tecnocratas em vários Estados importantes do país, particularmente no eixo Rio-São Paulo, realizando estudos e projetos alternativos à administração populista.

Além disso, no caso do IBADE, selecionar e financiar os candidatos anti-janguistas nas eleições de 1962. Temiam eles não a figura de João Goulart em si, afinal um político de temperamento conciliador, como se verificara no episódio da aceitação do parlamentarismo, mas à infiltração dos comunistas e dos nacionalistas apaixonados.

O marechal Odílio Denys, num depoimento dado a Hélio Silva (1964: golpe ou contra-golpe? RJ,1975), viu-o como “um Kerensky”, o político russo que em 1917, abriu caminho, sem o querer, para a tomada do poder pelos bolcheviques. Era crescente o número de oficiais que se inclinou para romper com a legalidade a pretexto de evitar uma “outra Cuba”.

O cenário internacional em 1964

Desde o término da Segunda Guerra Mundial, as relações entre os Estados Unidos e a União Soviética azedaram-se num confronto ideológico planetário, a chamada Guerra Fria. Ambas as superpotências dividiram o mundo em áreas de influência, governando cada uma o seu próprio bloco. Os Estados Unidos comandavam a OTAN (Organização do Atlântico Norte), a OTASE (Organização do Tratado do Sudoeste asiático) e o TIAR (Tratado Interamericano de Auxílio Recíproco) firmado com os países latino-americanos em 1947). Enquanto isso, a URSS liderava as forças do Pacto de Varsóvia, que cobria os países do Leste europeu: as ditas Democracias Populares (Polónia, Thecoslováquia, Bulgária, Romênia, Hungria e Alemanha Oriental).

Para os estrategistas norte-americanos o nacionalismo do Terceiro Mundo colocava-se objetivamente contra os seus interesses e, por conseqüência, aproximava-se estrategicamente da potência comunista. Mantiveram então uma política de ativa desconfiança para com os lideres populistas latino-americanos, fossem eles Juan Domingo Perón (da Argentina), Jacobo Arbenz (da Guatemala), Getúlio Vargas e João Goulart (do Brasil), Haia de la Torre (do Peru), ou Fidel Castro (de Cuba).

O cenário brasileiro em 1963-64

Depois de ter recuperado seus plenos poderes com o plebiscito de janeiro de 1963, a luta política entre esquerda e direita se intensificou e se disseminou por todo o Brasil. Os governadores dos Estados da Guanabara (Carlos Lacerda) Minas Gerais (Magalhães Pinto), São Paulo (Ademar de Barros), Paraná (Nei Braga) e Rio Grande do Sul (Ildo Meneghetti), todos eles anti-janguistas, praticamente desligaram-se do poder federal, recebendo aportes financeiros da Aliança para o Progresso diretamente do Estados Unidos, sem que Brasília fosse consultada ou comunicada.

No interior das Forças Armadas pode-se dizer que, desde os acontecimentos de 1961 , ocorrera uma nítida separação entre a oficialidade anti-janguista e o resto da tropa (suboficiais, sargentos, cabos e peças), quase sempre inclinada para Goulart. Cisão essa que gerava uma enorme intranquilidade na corporação fardada.

O general Argemiro de Assis Brasil, Chefe da Casa Militar e articulador do governo, montara um plano para colocar oficiais generais nos principais postos-chave que fossem ideologicamente afinados com o Presidente, garantindo assim o chamado Dispositivo Militar, formado mais ou menos por “uns 20 generais” (que, na prática, fracassou rotundamente).

O comício da central e a marcha das mulheres

No dia 13 de março de 1964, João Goulart decidiu fazer um comício de natureza radical na Central do Brasil, no Rio de Janeiro. Reafirmou então, frente a uma massa impressionante, o seu projeto de “lutar com todas as suas forças pela reforma da sociedade brasileira. Não apenas pela reforma agrária, mas pela reforma tributária, pela reforma eleitoral ampla, pelo voto do analfabeto e pela elegibilidade de todos os brasileiros, pela pureza da vida democrática, pela emancipação econômica, pela justiça social e pelo progresso do Brasil”.


O comício da Central do Brasil em 13 Março de 1964

O ex-governador gaúcho Leonel Brizola, por sua vez, a personalidade mais expressiva do nacionalismo radical, procurou atiçar a massa presente contra o Congresso, apontado-o como uma confraria de privilegiados que jamais aprovaria as leis que o Brasil necessitava. Contra este Congresso das Elites ele propunha uma nova constituinte da qual emergisse um Congresso Popular, formado apenas “por homens públicos autênticos”. Na observação do colunista Carlos Castello Branco o comício da Central foi “a festa das definições”(Dênis de Moraes – A Esquerda e o Golpe de 1964, pag.188).

Seis dias após o lançamento das Reformas de Base frente aos 300 mil trabalhadores que compareceram ao comício da Central do Brasil, no Rio de Janeiro, veio a resposta. Em São Paulo, tendo a frente o governador Ademar de Barros, 500 mil senhoras católicas, atendendo ao chamado da União Cívica Feminina, desfilaram na Marcha da Família com Deus pela Liberdade. Manifestaram-se contra “o comunismo” e contra a assustadora desordem que diziam ser instigada pelo governo Goulart (em seguida a vitória do golpe, no dia 2 de abril, a CAMDE, Campanha da Mulher pela Democracia, reuniu no Rio de Janeiro 2 milhões de pessoas).

Como se fosse a representação de um grande Auto medieval, as multidões, pró e contra Goulart, umas com a foice e o martelo, outras com os crucifixos, umas com bandeira vermelha, outras com a verde-amarela, encenavam nas ruas e nas avenidas brasileiras o derradeiro ato de um grande drama político que vinha se arrastando há muito tempo pelo país inteiro.

SOCIALISTA INTERNACIONAL HONRA A MEMÓRIA DE LEONEL BRIZOLA - PRESIDENTE HONORÁRIO

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